Mantendo a linha de análise de temas que podem efetivamente vir a ser objeto de cobrança nos concursos da área jurídica, vamos estudar uma decisão do Supremo Tribunal Federal que envolve dois assuntos importantes em sede de Processo Penal, quais sejam, Competência e Prova.

O STF, ao julgar a Reclamação Rcl 24473/DF (Segunda Turma, rel. Min. Dias Toffoli, julgamento em 26.6.2018 – Informativo nº 908/2018), tratou de diligência em residência de parlamentar federal, em particular o cumprimento de um mandado de busca e apreensão, determinando “a inutilização e o desentranhamento dos autos de todas as provas obtidas por meio da referida diligência, ordenada por juiz de 1ª grau em imóvel funcional ocupado por senadora da República, em desfavor de seu cônjuge.”

A Constituição Federal afirma, no artigo 5º, XI, que “a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial”.

Outrossim, o Código de Processo Penal, ao tratar sobre a “Prova”, particularmente “Da Busca e Apreensão”, afirma, entre outras coisas, que a busca domiciliar deve ser efetuada de dia, salvo se o “morador” consentir que se realize a noite, devendo ser apresentado (mostrado e lido) ao “morador”, ou a quem o represente o respectivo mandado.

Há de se observar que a diligência pode ser feita mesmo que ausente os “moradores”, conforme o disposto no § 4º, do artigo 245.

Desse contexto legal, vê-se que a casa é asilo inviolável do indivíduo, conceito que se confunde com o de morador, quando o objeto da busca se refere a esse indivíduo ou a objetos a ele vinculados.

O problema ocorre quando na mesma casa reside mais de um indivíduo (morador). Nessa circunstância o texto legal determina que o mandado, entre outras coisas:

  • Indique “o mais precisamente possível, a casa em que será realizada a diligência e o nome do respectivo proprietário ou morador; ou, no caso de busca pessoal, o nome da pessoa que terá de sofrê-la ou os sinais que a identifiquem” (Artigo 243, I);
  • Mencione “o motivo e os fins da diligência” (Art. 243, II).

Outrossim, a busca em casa habitada “será feita de modo que não moleste os moradores mais do que o indispensável para o êxito da diligência”, o que aponta para o fato que, a despeito da busca se dá em uma casa, o mandado deve particularizar o máximo possível o seu objeto de forma a preservar os moradores que não são objeto ou estejam envolvidos com referido meio de prova, o que se amoldaria ao disposto no artigo 5º, XI, da CRFB.

A decisão sob análise mostra outro aspecto importante que envolve a figura do morador, ou seja, se um dos moradores da residência for um detentor de foro de prerrogativa de função, há de se observar de forma efetivamente precisa e individualizada o objeto da busca, apontando que o mesmo não se refere ao detentor do foro “privilegiado”, sob o risco de invalidação da referida diligência, com o reconhecimento da ilicitude das provas obtidas, de forma direta ou derivada, pela usurpação da competência do tribunal ou juiz respectivo, neste caso particular, do Supremo Tribunal Federal, conforme o disposto nos artigos 5º, LVI, e 102, I, b, ambos da CRFB.

Nesse sentindo, se a diligência tiver de ser realizada em casa, em que um dos moradores é um detentor de foro de prerrogativa de função, duas situações se apresentam:

1ª – A busca se refere ao morador detentor do foro de prerrogativa de função.

Neste caso, há de se observar a regra constitucional quanto ao foro competente para conceder o referido mandado judicial;

2ª – A busca se refere a outro morador da mesma casa (Exemplo: Marido, esposa, filho, filha, etc).

Neste caso, duas situações se apresentam:

a) É possível se apontar na decisão concessória da ordem e, portanto, no respectivo mandado de busca e apreensão, de forma precisa, efetivamente individualizada, que o bem objeto da busca não se refere ao detentor do foro de prerrogativa de função, quando vislumbra-se a possibilidade de emissão da ordem por juiz de primeiro grau, ou outro órgão do Poder Judiciário, a despeito da competência que envolve o detentor da respectiva prerrogativa de função.

b) Não é possível determinar a prévia individualização dos bens que seriam de titularidade do detentor da prerrogativa, ou daqueles pertencentes ao não detentor de prerrogativa de foro, quando deve ser observada a competência vinculada ao detentor do foro por prerrogativa de função.

Há de se observar que houve voto divergente (vencido), e, portanto, discussão jurisprudencial, quanto ao assunto, que considerou válida a diligência, dirigida a bens pertencentes a pessoa que, naquele momento, não detinha foro por prerrogativa de função, apontando, ainda, que:

“A seu ver, o endereço da diligência não funciona, por si só, como causa de atração da competência do STF, por ausência de hipótese constitucional que, explícita ou implicitamente, autorize a derrogação da competência das instâncias ordinárias.

A Constituição da República não disciplinou prerrogativa de foro calcada em locais de prática de atos processuais, limitando-se a prever a competência originária da STF, em determinados casos e com foco no exercício de funções públicas desempenhadas por investigados ou acusados” (Posição do Min. Edson Fachin).

 

Por fim, sugere-se como estudo complementar, a leitura dos seguintes artigos:

  • CFRB: Art. 5º, caput; incisos XI, LVI; Art. 102; Art. 105; Art. 108.
  • CPP: Art. 69; Art. 84 a 87; Art. 240 a 250.
  • CP: Art. 150.
  • CC: Art. 70 a 78.

 

Na próxima postagem, analisaremos algumas questões atinentes ao tema.

Continue nos seguindo…Bons estudos!